(Foto: Marcello Casal/ Agência Brasil)
Mais de 1,4 mil pessoas foram resgatadas de condições análogas à escravidão no campo durante o primeiro semestre de 2023. O número foi divulgado nesta terça-feira (10) no relatório parcial Conflitos do Campo, produzido pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), e representa o maior índice registrado nos últimos 10 anos.
De acordo com o relatório, além dos 1.408 resgates, foram computados também 102 casos de trabalho escravo rural durante o período. Ainda segundo o documento, a maior parte das pessoas resgatadas este ano trabalhavam em atividades econômicas ligadas ao agronegócio, como o cultivo de cana de açúcar (532), lavouras permanentes (331), mineração (104), desmatamento (63), produção de carvão vegetal (51) e pecuária (46).
Para a CPT, o aumento no número dos resgates “demonstra a maior visibilidade para estas violências, através da atuação de órgãos de fiscalização” dos governos federal e estaduais.
Conflitos
Segundo o relatório, nos primeiros seis meses de 2023 foram registrados 973 conflitos no campo, o que representa um aumento de 8% em relação ao mesmo período de 2022.
Como nos anos anteriores, os conflitos por terra continuam sendo a maioria (791). Em seguida vêm os casos de trabalho escravo rural (102) e conflitos pela água (80). O levantamento aponta que, neste ano, os conflitos afetaram quase 527 mil pessoas e envolveram cerca de 102 mil famílias.
Os povos indígenas foram os mais atingidos pelos conflitos, com 38,2% dos casos, seguidos dos trabalhadores rurais sem terra (19,2%), posseiros (14,1%) e quilombolas (12,2%).
Entre os principais causadores das violências no campo destacam-se os fazendeiros, com 19,75% e o Governo Federal, com 19,33%. Na sequência vêm os empresários (16,95%), governos estaduais (13,31%) e grileiros (8,54%).
“Além do agronegócio, que gera alta contaminação por agrotóxicos, os empreendimentos de mineração, usinas hidrelétricas e também energias renováveis, como a eólica, são apontados como fatores de conflitos que impedem o bem viver de comunidades tradicionais em todo o país”, afirma a CPT.
Violências
Ainda sobre os conflitos por terra, o relatório aponta que neste ano 878 famílias tiveram as casas destruídas. Outras 1.524 perderam seus roçados e 2.909 tiveram os pertences destruídos. O número de famílias expulsas de suas terras foi de 554 e os despejos judiciais no campo somaram 1.091 casos.
Em relação às violências contra a ocupação e a posse, o documento revela o crescimento dos crimes de pistolagem (143), grilagem (85) e invasão (185).
Os casos de violência contra a pessoa subiram de 418, no primeiro semestre de 2022, para 779 neste ano. Nestes casos, destacam-se os danos causados pela contaminação por agrotóxicos (327) e a contaminação por minérios (55).
O número de assassinatos no campo, contudo, teve uma queda de 51%, passando de 29, em 2022, para 14 neste ano. Segundo o relatório, quase 80% dos casos registrados em 2023 ocorreram na Amazônia Legal (11). Os povos indígenas (6) e trabalhadores sem terra (5) seguem como os grupos mais vitimados.
Ao fazer o recorte de gênero, o levantamento revela um aumento na violência contra as mulheres no contexto do campo, passando de 94 registros, em 2022, para 107, em 2023. Neste caso, o documento ressalta os estupros de 30 adolescentes yanomami por garimpeiros ilegais no mês de fevereiro.
Ainda em relação às violências contra as mulheres no campo, foram registradas situações de intimidação (20), ameaças de morte (16), agressão (6), criminalização (5) e cárcere privado (5).
Metodologia
Os dados do relatório parcial Conflitos no Campo 2023 foram obtidos a partir de denúncias recebidas por agentes da CPT em todo o país, notícias veiculadas na imprensa e estatísticas oficiais de órgãos públicos.
Jaqueline Deister/Agencia Pulsar Brasil/Berokanfm